Alguém que me lê e eu não vejo.

2004/12/29

Palavras à chuva numa tarde...
Apetece-me beber sofregamente o fio líquido que se esvai desta quadra da família e dos afectos. Abandono o resto, tudo além daquilo que era puro, simples e me faz falta. Tudo aquilo além do quanto eu queros estes meus mundos sempre por perto. Repudio os sapatinhso de cristal e as barbas brancas do idosos de faces encarnadas.... Repudio o tempo que tudo muda, resoluto, imparável.
Em mim aprisiono as palavras à chuva de uma tarde, que dispararam sobre mim todos os sonhos que contenho... o rio corre, sim, irredutível, em frente... mas tu não. Não o teu olhar de sereia perdida, encantada, no oceano de lágrimas azuis, felizes. Tu disseste que valho não como ouro, nem diamante, mas sim o sal que se dissolve nos paladares e no sangue, nas secreções, nas vísceras. Diz-me! É por isso que continua a saber bem correr na relva, por isso que mergulho, por isso que digo que aprendo a viver. Para que te orgulhes de mim de uma forma inabalável, dura. És deslumbrante,ainda que nesse teu jeito de lutadora camuflada, esse jeito que surpreende, que viola, que despedaça os nós de mármore que enfrentas. Esse teu jeito que vence impreterivelmente. Não, só isso não te deixo dizer, isso não mudará, não, querida.

2004/12/20

Vagueando o olhar por entre as nuvens que não se esforçavam por esconder a lua, pensava nisto, que me disseste assim em tom de voz passiva atirada ao acaso para as nossas frases. Pensava-o enquanto a pouco e pouco parecia despertar, para este mundo meigo que criei à minha volta, um mundo que eu fiz para me esconder de outros mundos sobrepostos. Caminhava por entre montras da noite, vitrinas despidas, luzes escondidas, sentimentos reguardados. Dentro de mim. E pensava-o, será que é possível mesmo dar um sentido ao porvir? Será mesmo que as pessoas não despejam essas questões pseudo-filosóficas para limarem de uma forma discreta e elegante as aretas afiadas dos seus egos? Provavelmente espero uma resposta estridentemente afirmativa... ninguém é realmente profundo e poucos conseguem saber quais são as verdadeiras questões... tão pouco eu caminho sobre a água da clarividência, algumas das certezas prefiro-as mesmo submersas. O porvir, os ideais, o sonho: murmúrios inaudíveis, irreproduzíveis, distantes... tantas vezes!

2004/12/06

Um piano invisível,
notas que fluem afinadas por sentimentos que não se ouvem...
Uma lágrima ilegível ,
versos egoístas pertencem a todos, não são de ninguém...

Hoje vi essa lágrima escondida no horizonte de alguém não tem sede para lágrimas,
vi nesse olhar a falta daqueles olhares que veêm.
Vi um rosto sujo, senti umas mãos frias, vi um rosto desnudado de orgulho,
um rosto que não se pode abrigar num dia de chuva, um rosto que nunca se pode abrigar.

E tudo isto, surgiu ao longe, como se não pudesse ouvi-lo,
um ecoar breve da dor não-dimensinal dentro de mim.


2004/12/02

De facto, as horas na faculdade, o estudar, um trabalho que me anda a dar que pensar... tudo isso, não me tem deixado muito tempo meu, muito do (que já era pouco) tempo que me sentava por aqui, nesta cadeira, e passeava-me por poemas e linhas soltas... com o tempo, o tempo parece fugir. Sim posso dar-me ao luxo de usar este tipo de frase, porque mais ningúém, senão eu disfruta verdadeiramente do que aqui está, quando o partilho sorrio.

O trabalho continua amartelar no meu pensamento... ao menos se eu pudesse acrescentar algo novo! Mas sem contacto com a ciência, apenas em contacto com páginas pesadas, nada consigo acrescentar, nem posso.

Apenas disperso entre palavras e ideias já concebidas. Resta-me pois divagar ao sabor daquilo que me fascina e também ao sabor daquilo que faz um reflexo pálido nos meus olhos. Metáforas que me são quase proíbidas e que por vezes parecem ganhar uma certa condescendência. Tenho de escrever como penso que penso sobre o facto de talvez ser bom anotar aquilo que penso. Talvez assim, não descubra muito sobre o mundo, ou sobre a ida e talvez nem dê qualquer tipo de sorriso a ninguém, mas descobrir-me-ei um pouco mais.

2004/11/24

Já há muito que aqui não vinha. Ao ler assim, nada me apeteceu escrever... coisa de amadores. Vou recolher-me a incontáveis páginas de livros, com conteúdos que muitas vezes nem sei porque tenho de saber... talvez um dia compreenda, talvez um dia compreenda um bocadinho mais. Hoje vou ficar por isto mesmo, meia duzia de palavras sem grande teor mas com votos de voltar em breve e deixar aqui algo mais.

2004/11/14

Deram-me autorização para colocar aqui estas palavras: uma carta de um avô para um neto em convalescência. Eu deliciei-me a lê-la... deliciei-me com a ternura que as palavras trazidas de longe podem carregar com elas. E assim, partilho aqui um momento anónimo, que poderá não interessar a ninguém, mas que acrescentou uma lágrima de carinho ao meu dia. Aqui vai...
"Eu e a avó estamos sempre contigo, tanto na operação, como no teu restabelecimento, pedindo a todos os santos que te melhorem de saúde e de vontade de viver; e assim ajudares o teu pai e a tua mãe, com essa vontade. Amanhã a tua avó, a tua tia e os teus primos vão visitar-te. Eu não vou, mas aceita os meus carinhos e as minhas orações onde estás sempre presente, para que rapidamente melhores e fiques bem, pois o Celta de Vigo tem necessidade de um ponta de lança!
Sabes que a tua mãe e o teu pai sofrem muito com tudo o que se está a passar e não choram para que tu não sofras. Mas vontade não lhes falta, portanto tenta ser forte e ajuda-os, de vez enquando, nesse sentido. Para já, da minha parte conjuntamente com a avó, recebe um grande abraço de amor para a tua recuperação: sem dores e cheia de boa disposição.
Como não posso ir vai a minha presença através desta pequena carta. Um grande abraço do avô amigo que muito te adora.
Há uma canção antiga que nunca esqueci e é assim:
Descansa meu querido descansa,
não te quero despertar,
vou para a cozinha trabalhando,
com vontade de chorar.
A minha mãe cantava-ma e é o que passa com a tua mãe que tanto te quer."
Estas são as pessoas que mais amamos, aquelas das quais não podemos prescindir. Fiquem sempre comigo, por favor!

2004/11/03

Não, normalmente nunca dou por mim a indagar quantas pessoas estarão a pensar em mim num determindado instante. Contudo, é possível que tal como eu penso nelas, as pessoas que fazem parte de mim, me pensem também. Se calhar aquela senhora que ajudo a descer com o bébé do autocarro, talvez se lembre de mim. Talvez aquela amiga de infância, que nunca mais vi, pense em mim. Não sei... importa-me mais que continue a florir os meus pensamentos com todos vós. Que continue a partilhar o que vou tendo convosco. Hoje dei por mim a escrever estas palavras... elas alimentam-me sempre que preciso de um suspiro quente de ternura, sempre que a lágrima está implicita numa glândula escondida, sempre que o sorriso se esbate sobre as folhas que vou rasgando. Hoje foi um desses dias.



2004/10/27

...pense em cada parágrafo de tal forma que a idéia central apareça na primeira linha, a argumentação no meio e a conclusão na última sentença;

Pára de chorar!!! Já te disse!!! Ordeno-te que pares de chorar!!!
Se parasses de chorar, talvez me enternecesses com a tua folha de papel branco, a folha onde te escreves e q escondes por detrás de lágrimas e supiros impensados de dor. Quando choras não ouves.
Então não chores mais, não chores sempre, porque a chorar nunca me ouvirás dizer que gosto de ti.

2004/10/24

É por alguns instantes esta sensação de que nas veias corre sangue misturado com ilusão, com vontade e com esperança. A inspiração de uma criança que salta por cima das nuvens cor-de-rosa. No fundo é disto que eu falo, do que pode não ser palpável, do que pode não se beber, do que pode esgueirar-se por entre grãos de poeira. Falo daquilo que também pode encostar-nos a uma parede, tela negra forrada de veludo azul, e espremer-nos até ao fim. Mas do que falo não interessa se não o digo...

.... manhã de Outubro: chuva, tapetes de tule branco, passeios encobertos por mantos de pessoas encasacadas. Sinto-me como se não me sentisse, caminho como se voasse, e acomodo-me no muro de pedra polida resguardada por um alpendre familiar, mas que não pertence a ninguém. Alojo-me na vontade de querer repatir-me e ir de encontro a todos os lados. Quero percorrer caminhos até chegar mais longe e mais alto, onde não estou. Quero invadir cada pessoa com o meu sorriso, o meu gesto, o meu sobrolho fransido.

Mas não vou, não percorro, não invado.Será mesmo que o mundo, que os lugares, que as pessoas já têm suficiente de mim?

2004/10/22

O que é ter isto tudo aqui comigo?
Como espinhos de castanheiro e não de rosa,
acumulados nos meus suspiros vespertinos,
emaranhados nas minhas lágrimas pela noite dentro.

Oh! Quem dera arrastar por aí este corpo baço,
para que só os sorrisos o vissem, para que fosse invisível
a esqueletos fugídios, a interesses de feiticeitos, a estrelas invejosas,
a tudo isto que parecem fábulas de olhares tristes,
olhares molhados pela derrota.

Quem dera conseguir soprar ao mundo,
que rastejo quando ando,
que toda a energia se envolve em mim como setim,
que é macia mas escorrega.
Quem dera que o mundo inspirara,
este ar quente que me abafa,
que por um momento aspirasse
as correntes sujas,que por um momento,
mundo, suportasses o seu asco.
Quem me dera olvidar tudo o que fui, para não ser,
para cobardemente não ser, só um bocadinho, só aqui.

Deixem-me não ser: rosa púpura, estrela invejosa, feiticeiro dúbio, todos!!!

Deixem-me ser invísivel, deixem-me não ser... é só o que eu quero, só um bocadinho,
só aqui.

2004/10/11

Estou por aqui a sorrir.... Ainda te lembras? De como te conheci naquele dia de chuva infernal? De como nos tornámos próximos? De como fomos testemunhas dos suspiros um do outro? Conhecemo-nos naquele dia, na sala de aula. O professor rabiscava já algumas linhas no quadro, eu estava na última fila, entraste e emulsionaste o teu sorriso, o mesmo que muitas vezes viria a varrer as sombras do meu espírito.

Às vezes vou na rua, nos autocarros e começo a prestar atenção a conversas, ouço muitas vezes por aí que nos dias de hoje já não se "fabricam histórias de amor como antigamente". Interrogo-me o que as pessoas querem dizer com isto? já não sabem os jovens o que é o "amor verdadeiro". Já não têm os jovens que ultrapassar barreiras sociais porque estas são mais ténues, já não passam eles grandes privações, já não precisam eles de se esconder. Será mesmo tudo mais simples? Vivemos num mundo de divórcios, de ligações fortuitas, algumas até levianas... não me cabe analisar o porquê, mas constacto que os laços entre as pessoas são cada vez mais frágeis. Muitas pessoas sobrevalorizam a sua individualidade o seu "eu", em detrimento da partilha de bens como... o coração. Ouço muitas destas coisas, constacto-as, mas são todas elas como um eco ao fundo duma praia, ecos partilhados por rochedos elevados acima do mar, indiferentes.

As palavras jamais descreveriam as dimensões de como nós nos amámos, as palavras que abrangem todo o infindável, interminável, infinito sentimento que encerravamos dentro de nós. Jamaias encontraria lugar nas linhas deste blog, nem na soma de todas as linhas de todos os blogs concebidos e por conceber que refugiassem todas essas palavras.
Agora somos nós e o Outono, rodeados pelas folhas e pelo vento, pelos nossos beijos e pelas nossas carícias. Agora consinto em escrever isto. Tudo em mim é também o teu mundo e os teus olhos nos meus, muitos dias depois de termos conhecido o sorriso um do outro.

2004/09/17

Corres, corres, corres, sempre a correr sempre a arfar
nunca esgotas esse olhar dilacerante sobre os caminhos.
Não interrogas permanentemente, vais, corres.
Foges de fugir desse mundo insípido, cheio de presilhas imprevistas....
que desabotoas com frequência.

Tem que ser, nesses infernos cheios de "ques".
Porque é essa a meta, de quem corre, de quem salta de quem foge de fugir.
Esgalhas por entre cêntimos e por entre filas de espera.
Tens meio século e não podes continuar a correr, mas tu foges de fugir...
O coração é fraco já, está cansado, mas aguenta, tens cataratas mas mantens o teu olhar.
O teu filho, quer correr e quer voar e não pode, tens que o desencarecerar, mais um fecho que tens de abrir, mais uma ruga que acrescentas à tua expressão fatigantemente pálida.

Não és mais que um número escrito algures, um conjunto de algarismos aleatórios
que jazem em prateleiras ou pedaços de sílicio...
não fazes diferença por lá.
Mas sem esmorecer recusas-te a parar, até ao dia em que descobres que há mais um "que":
O "Porque". E então resolves andar por aí a somar "porques"... até que no conjunto, todos formam um "porque" que ninguém poderá deixar de escutar: "porque não"!

2004/09/08

Chove na cidade onde penas de aves apressadas, em busca de abrigo, flutuam comandadas por um vento ameno. A chuva cai sem força mas cai convicta. Os autocarros deslizam nas ruas para que as pessoas possam chegar a algum lado. Um casal de gaivotas foge das turbulências do oceano, procurando o aconchego de um beiral. O vigor da água caída do céu escuro aumenta numa cadência típica dum crescendo musical...
Todo este cenário se reflecte em mim através de quatro pedaços de vidro que constroem uma janela. O edifício que me acolhe encerra décadas de lágrimas e sorrisos, de suspiros e de palpitações... de empenho árduo e suave boémia. Resguardo-me, aqui sentada, onde começou a Universidade do Porto, no edifício vulgarmente chamado “Leões”: uma alusão pertinente à fonte que banha a sua entrada principal. A fonte onde lamentações se afogaram e onde começaram algumas existências... águas onde couberam muitos mundos ansiosos de vida e conhecimento. Caminho pelos corredores imensos, que já deixaram de ser labirínticos, e estórias renascem com palavras repletas de esperança. Recantos sensuais onde começaram longas uniões. Bancos onde escorreram prantos de desânimo e que ouviram repetidos cânticos de orgulho. Estes locais que somados me têm ajudado a ser um pouco maior e que recordarei com as palavras, os aromas e a sensação de frio no Inverno. É reconfortante estar aqui, encostada a este granito secular, a esta janela enriquecida pelo mundo, pois cada murmúrio de existência neles gravado amplifica cada segundo dos meus horizontes tremidos.

2004/09/05

Alguma vez pensaste no porquê?

Dos sons fluirem afinados por noites distantes.... em que pequenas lágrimas parecem unir os nossos dedos outrora trespassados pela mesma brisa arrepiante junto ao mar.

2004/08/30

Um novo mundo onde o tempo é senhor de escravos do dia-a-dia.

Não costumo tolerar este tipo de frases, que nascem em análises feitas por mim, igualmente escrava e com sentimentos por vezes tão vis. Mas se as palavras me chegam até às mãos, que lhes fazer? Calá-las e emendar o que sinto? Ou deixá-las acamadas dentro de mim, esquecendo que um dia foram de alguém?

É assim, mesmo sem virtude, mas com voz, que venho denunciar: numa altura em que bastantes pessoas suprimiram várias das necessidades inerentes à sua própria condição humana (algumas até pensar). O fulcral, o sangue da vida, parece extinguir-se! E com lágrimas, como gotas sinistras, em sinal de que algo está em falta, chora-se. Chora-se, não por dor, nem por amor, mas por falta de tudo isto. Existe mesmo alguma água no mundo pior do que estas lágrimas salgadas? Haverá sal no mundo, mais amargo que este pranto? Nem todos são assim, nem todos são. É na relatividade que encontro recantos de aconchego.

2004/08/26

De mansinho, numa névoa urbana com cheiro a maresia, as sensações chegaram em paralelo para nós e para o mundo distraído. Apareceram tanto para mim como para ti, para mim no sorriso e para ti nas palavras. E, então, falaste-me, para que eu escutasse sem poder elevar a atenção a outros sons. A tua voz tocou na minha pele arrepiada e eu sorri-te o que me disseste. Porque a sorrir pensei mostrar-te, com os olhos inseguros, o que eu estava segura de sentir. Ao passo que era denunciada por tudo em meu redor que sentia comigo: o vento, o mar a olhar de esguelha, o veludo disfarçado das nossas mãos entrelaçadas. Foi nesse instante, já longínquo, em que eu quis ser tudo, que eu escolhi que o mundo ia caber no teu olhar...

2004/08/04

Porquê não sei. Talvez essa seja mais uma pergunta sem sentido. O porquê não sei, de facto, mas perdi-me no meio de tudo isto: que era suposto ser vivido e ser sentido. Limitei-me a ir indo, sem grandes precipitações mas quando dei por mim, uma a uma, as pessoas tinham ficado para trás. Estava só e tudo em meu redor não era senão uma redonda capa de breu na qual eu me embrenhava sem qualquer receio.
E agora que me apetece voltar? Agora depois de ter entornado muitas das minhas lágrimas, que caminhei tanto que o fôlego começa a faltar-me, agora o que farei?
Não hesito demasiado. Faço aquilo que alguns momentos me ensinaram até hoje: rastejo pelos sorrisos que me acolhem, limpo algumas das lágrimas que vejo chorar sem me dar conta que estou profundamente vazia. Do mais triste é sentir que cumpro a minha tarefa: existo. Sob que forma, se bem ou se mal, nem sequer questiono muito. Está demasiado apertado o nó desta gravata que todos os dias ato à minha garganta. Aperto-o bem para que ninguém ao querer arranjar-mo me sufoque. Aperto-o bem para calar estes gritos pavorosos de dor que estoiram dentro de mim. Está demasiado para eu continuar a existir sem ser nada. E peço a quem nunca assim se sentiu que venha aqui e se sente ao meu lado e me ofereça umas palavras coloridas num dia qualquer inesperadamente.

2004/07/24

Todo o conjunto de vivências que faz de alguém que escreve alguém que escreve, poderá um dia tornar-se muito insuficiente. Ou poderá sempre ter sido insuficiente, mas até a um determinado ponto permitir a alguém que escreve continuar a fazê-lo. Talvez nem sequer seja humano alguém achar que todas as suas vivências são suficientes, caso contrário acusa-se  morte imediata, do espiríto.
Esta dissertação, nem conclusão tem sequer, apenas culmina numa ideia prévia de que reinventarmo-nos é preciso. Pois então, que assim seja.

 
PS: Vou tirar umas férias pequeninas :)

2004/07/17

0:58
ição... ambição, disposição, destruição, fruição. E são estas as letras que se juntaram aqui, acredito que por acaso.
 
1:05
Encontro-me numa fase um pouco sombria. Se eu fosse uma artista diria que estou sem inspiração. Nestes últimos tempos, direccionei tudo para um só fim e, quando isto acontece, sinto que todo um mundo passou por mim sem que eu me apercebesse. E passou... eu estava encerrada no meu objectivo imóvel. Não o agarrei, não como eu queria. Não tenho nada para partilhar, nem existe ninguém com quem eu pudesse partilhar o que quer que fosse. Partilho o autocarro, a chuva, o mar, o cheiro de terra húmida, mas não partilho a ideia que tenho de tudo isto. Encerrei-me sem que ninguém me obrigasse a fazê-lo e detesto isso. Arrepio-me comigo, velha, cansada, procurando um cantinho de paz no Mundo... Onde fui eu buscar isto? Esta falta de ambição de sonho!?
 
1:17
Intrigada com as últimas palavras, ando à deriva por entre a disposição dos meus dedos pelas frases que traço mentalmente. Afasto-as.
 
1:18
Um dia cheguei a casa e ouvi um grito, eras tu... tu... tu... sempre tu... foi há tanto tempo! (Agora as palavras estão a chegar-me fluidas, mas sem regras nem lugar certo.) Corria, dum lado para outro, agachava-me nos cantos, respirava fundo, escutava o meu coração doente de tanto bater, muito batia muito, às vezes não conseguia respirar. Os gritos somavam-se, multiplicavam-se e o meu coração galgava até à minha garganta. Só ia lá quando achava que alguém ia morrer, morrer mesmo. E não estariamos já todos mortos naquela altura? Depois eram as lágrimas e as conversas, eu não percebia as conversas, mas percebia as lágrimas. Eras sempre tu... Apetecia-me rasgar-me da minha própria vida, arrancar os meus ouvidos, engasgar-me nos gritos que tinha que engolir, sair a correr e nunca mais voltar... mas fiquei lá. Eras tu... sempre tu... nunca sabia quando ias precisar de mim. Afinal na altura das lágrimas e das conversas, depois dos gritos, depois do medo, era eu que te dava as minhas mãos geladas. Porque não havia mais ninguém, nem mais mesa, nem mais louça. Destruição.
Um dia viemos embora e renascemos, o que quer que isso tenha significado.
 
1:27
Mais tarde, chegaram outros dias. Os dias em que o medo e as lágrimas se transformaram em sorrissos. As conversas... nessa altura não me lembrava delas. Éramos apenas nós, e a fruição de todos os cantinhos a que o nosso amor nos levava.
 
1:31
Afinal as letras não se juntaram aqui por acaso.
 
1:34
"E são estas merdas" que num dia como o de hoje me farão apagar este blog. Hoje não escrevo mais. Não vou alongar o post mais ridículo e ao mesmo tempo mais "isto" que alguma vez escrevi.  
 

2004/07/15

Pois é... realmente a minha passagem por aqui foi fugaz, mas em ambiente de exames os únicos poemas que poderiam fluir seriam carregados de palavrões, ou então muito deprimentes... de modo que estou à espera de (no sábado) terminar o último exame e regressar com um pouco mais de sol.

2004/06/26

Reencontrei-me aqui, hoje... já sentia a falta destas teclas e destas palavras. É bom estar de volta: dá-me sempre aquela sensação de começar algo novo, que não sei muito bem o que é. E isso basta para me roubar alguns sorrisos tolos!

2004/06/15

Já tive mesmo aquela sensação de ter chegado ao fim de mais um caminho. Um fim onde cheguei exausta, num daqueles dias em que o sol dilacerante arde na pele, beija os nossos movimentos e os prende, deixando-os pesados. Então, de imediato, senti um certo alivio: afinal tinha chegado ao fim de um caminho cansado e precisava de devolver o fôlego à minha respiração apressada. Foi a sensação de um fim harmonioso.


Nem sempre é assim.


Certa vez seguia eu, caminhante, ora por mantos de paisagens verdejantes ora por vielas profundas de bruma negra, tentando encontrar o dono de um perfume que me preenchia todos os instantes da minha existência. Continuava, no encalço daquele destino abstracto, dentro das noites em ruas despovoadas e dos dias pelas calçadas que gritavam. Tudo em meu redor se adicionava ao meu ritmo incessante, que me levava sempre na mesma direcção.
Até ao dia em que, sem ter chegado a um beco nem a um desfiladeiro, soube que tinha chegado ao fim. Soube-o porque o sentido se tinha varrido daquele abstracto destino para o qual caminhava. E tudo o que parecia óbvio se desvaneceu e o odor, o rasto intenso daquele perfume que eu procurava, desapareceu. Gelifiquei perante a certeza paralisante de que não existia alguém a quem aquele aroma pertencesse. Mas não sei quem me trouxe esta certeza. Pergunto-me ainda como é possível sentir aquele odor feérico por vezes?... aqui, em mim... se nunca lhe toquei., se não toquei na essência de onde ele chegava. Mas foi essa essência que me guiou e foi ela que me trouxe de volta, intacta, com vontade de perdurar na busca mas com a lágrima de resignação. Deixou-me sem caminho. Cheguei ao fim do caminho, sem terminar a busca, sem me fatigar. Mas tenho passos, tenho muito ainda que alcançar.

2004/06/11

Para uma amiga...

Ontem fizeste-me uma crítica, relativemnte ao que escrevo, e eu fiqueia viajar nela, porque sou assim, porque aquilo que vem do exterior me toca sempre. Embora não sejam todas as paisagens as que me tocam, são todas aquelas que de algum modo já cá estão dentro, como os amigos. E para que conste não fiquei chateada, nem aceitei mal as tuas palavras... mas deixei-me a pensar neles. Deixei-me a pensar nas tuas perguntas. Nos "porquês" de me teres perguntado. Sabes... se há coisa que eu acredito é que não se fazem perguntas por acaso. E há sempre algum propósito nas respostas às nossas perguntas, há sempre algo para que nos faz falta saber. Nem que seja para ajudar as pessoas a perceberem-se, quando ouvirem as suas vozes a dizer aquilo que não escutam da alma. Só me deixei a pensar, e antes de ficar chateada aqui te agradeço que o tenhas feito. Porque não são palavras como "tão bonito" que me vão fazer continuar...

No seio de tudo isto, recordei Fernando Pessoa no que diz respeito à criação. Ele defendia que a criação era um acto onde confluiam duas componentes: a exterior e a interior, relativa ao nosso espírito. Ele defendia que jamais a arte de criar estaria completa se não se referissem estas duas, porque jamais "seria a mesma coisa estar triste num dia de sol do que num dia de chuva". E eu o que tento recriar com as palavras é a paisagem interior, tal e qual como ela me perturba ou empolga. Portanto eu percebo o que disseste, porque as palavras não são muitas nem o sentido é ausente daquilo que escrevo, ele está lá quando eu o leio. A grande questão é que pode não chegar a todos, ou deturpa-se porque as palavras são muitas e o sentido "paira". Mas se eu creio que escrevo bem e se me deixo continuar nessa crença é para que não me detenha, pois por cada palavra que escrevo, há muitas que deixo escapar. Esqueço-me da paisagem exterior, algumas vezes... mas não sei se quero mudar isso. De qualquer da formas,fiquei a pensar nisso. Pelo que escrevi isto e esrevi-o aqui. Para que aqui te possa deixar o meu sorriso sincero.

Termino com Pessoa: Se eu disser "Há sol nos meus pensamentos", ninguém compreenderá que os meus pensamentos são tristes. Termino com ele porque nem sempre quero que compreendam, se é bom ou mau só contigo é que comecei a pensar.

2004/06/05

I had no time to hate, because
The grave would hinder me,
And life was not so ample I
Could finish enmity.

Nor had I time to love, but since
Some industry must be,
The little toil of love, I thought,
Was large enough for me.


Emily Dickinson

2004/05/30

Ontem li num blog, muito bom, perdido de propósito algures pela web, algo muito interessante. Respondendo a um desafio dum amigo, o autor pegou em palavras ditas horríveis e juntou-as num poema.
De facto juntar palavras para dizer algo bonito, algo que te faça sorrir nunca foi muito complicado. Havia tanto para te dizer. Tantas palavras bonitas que eu podia deixar perdidas nos livros que me emprestaste. Tantas mensagens que podia ter-te enviado. E, no entanto, deixo em branco todos os caminhos que me poderiam levar até ti. Porque sei que já recebeste todas essas palavras, porque já houve quem percorresse esse caminho e já houve quem o estilhaçasse.
Já viste essas palavras tantas vezes que elas perderam a cor. Nada de novo, não sei acrescentar nada de novo ao teu mundo, o caminho que não percorri já está gasto.

Já pensaste nisso?

As palavras belas já estão gastas de serem tão fáceis, tão verosímeis. E aquilo a que chamamos palavrões, por serem feios, alguns asquerosos, fazem-nos sempre questionar... "será mesmo para mim?" "MEU DEUS eu não mereço isto" "Dizes isso porque não és suficientemente boa para estares aqui comigo!"

É neste ambiente inóspito, de linhas vazias, que resolvo finalmente falar-te:

És um imbecil, um insignificante! Escondes-te num ninho de ratazanas imundas e permaneces, no odor fétido dos seus bafos, tu e a tua alma moribunda, infestada! E o que vês? O paraíso. Que mesquinhez!

Eu navego no esgoto, sim. Mas levo comigo a esperança de um dia desaguar no mar. Contigo ou sem ti.

2004/05/29

És incontrolável. És contagiosa.
És um tabique vertical com contornos dos mais simples, onde se acumula a fuligem dos anos.
És capaz de corromper o pôr-do-dol, de esconder na noite a linha luminosa que transparece pela janela.
Hipnótica, embargas a minha existência desde que te conheço, desde que a minha memória remota me permite vislumbrar a tua imagem.
Hoje, estonteante, a tua presença ofoscou-me,fez com que imergisse no mar glacial do teu sorriso.
Contudo, não deixei que me resgatassem de ti.

E ainda te chamam verdade!!!
Que palavra tão pura e tão macia para descrever uma realidade tão feroz e tão pouco subtil! Tens tal envergadura nas frases das pessoas que por aí ouço palrar que não transpareces jamais tudo aquilo que podes ser:

...certeira...
...afiada...
...entorpecida de tanta dor e desprezo.

Não conheces a dor refinada do vulnerável corte que deixas no vulnerável tecido por onde passas.
Oh lâmina que trespassa seda, hoje fragmentaste-me, fizeste-me tropeçar no caminho, deixaste-me nua à tua mercê, à tua vontade de pudor ausente!
Todavia não te recusei. Se assim vieste foi para que me espalhasse sobre mim mesma.

2004/05/26

Ainda existem pessoas que chamam a estes momentos de euforia, de alegria e orgulho, futilidades. Pois se podemos chamar futilidade à união entre as pessoas, às lagrimas de felicidade, ao orgulho e ao olhar de relance para o futuro com optimismo... pois que assim seja. Tenho apenas uma palavra: POOOOOOOOOOORTO!!!!

2004/05/24

Ainda é cedo. A noite é irremediavelmente quente... pelos temas que por ela se vão arrastando, por algumas ideias que se deixam debater quase sem força.
Equilíbrio. A palavra que mais tem sido lançada, que tem ficado a pairar nos canais auditivos dos presentes até acabar por se deturpar e perder o sentido.

O efeito de expressões como "motivação política" ou "tipo especial de violência" parece ser evidente. Quer deixá-las a pensar. Anula as pessoas. Aterroriza-as. Mas em poucos segundos resguardam-se nos seus escudos invísiveis que só elas julgam existir. É o poder do pânico, a preguiça de querer saber algo mais. A certeza de que num qualquer instante se assegura algo imprevisível, desconcertantemente avassalador. Mas é precisamente esta certeza de nada, que nos reconforta...

"Pode ser aqui!" O coração palpita. "Mas dificilmente será comigo." O coração sossega. "Até pode nem ser. Quem é que disse?" O coração suspira. Sorri-se.

Seguem-se mais expressões, mais risinhos... linhas soltas: "Prudência."

Sai-se. A sensação de que realmente o mais forte vence o mais fraco prevalece.
O vislumbrar do bom e do mau varia consoante o lado em que se está. Ignora-se muito.

Então vulgarizamo-nos rua abaixo, rimos de alguém que ouvimos. Os nossos pensamentos misturam-se com o vento: num de nós fica a violência do hoje, noutro fica o que faz sofrer, em mim a falta de clareza nos objectivos e em ti a guerra assimétrica. Eu continuo a pensar sobre as pessoas serem pessoas e sem, no entanto, saber definir pessoa.

No dia a seguir informar-nos-emos, para combatermos o vazio do desconhecido. Mas rapidamente ficaremos inundados, até uma próxima que acreditamos que nao vai acontecer. Porque não queremos.

Luminoso o meu olhar acaba por pertencer apenas ao céu escuro sob as estrelas, para trás estão expressões e ideias.

Fico eu e o mundo discreto.
Frio, gelo velho,
Na bruma silenciosa de uma caverna.

Calor, um fogo imenso,
Incomensuravelmente quente,
Desejo de ter e não ter.
Fugir a um tempo e voltar a dois...
Derreter beijos, fundir corpos,
Entregar e deixar queimar...
Quente como a cor do inesperado,
Um prazer que não é verosímil.
Não tem tamanho. Arde com o vento,
Pula com os rios e... grita!
Arde, queima, escalda,
Ferve areia sob sol incessante.
Pátio de aldeia soalheira.
Casa térrea, encostada a homens suados.
É paixão!
É desejo que não cessa.
Imparável volúpia que anseio
Como o peito, com o corpo, com o cabelo.
E que abraço com as pernas.
Vermelho macio,
Suave toque de sentimento.
E corro, e queimo, ardo em mim...
Combustão que nada perde, nem calor
Busco e não me detenho...
Continuo com o alento das chamas
Que, no meu interior,
Dão voz ao que incendeia.
E corro.
E fujo...
...sempre de encontro a ti.
Ando, fogo que me percorre e já não dói.
Não arrefeço. Energia.
Sou tudo, tudo, TUDO!
E tudo em mim quer,
Ao mesmo tempo,
Ser alguma coisa.
E é nada.
É desejo.
É querer e não querer.
Desejo de quem teme.
Lobos da noite que por mim procuram.


Olhos fechados, braços cruzados.
Olhar negro, poço sem fundo.
Frio. Sombra eterna.
Agror que não tem fim.

2004/05/14

Erguemo-nos. Encontramos o mundo. Embrenhamo-nos no dia estudado, já sabido. Caminhamos nas ruas indiferentes. Subimos as escadas indiferentes. Ouvimos as pessoas lá em cima, indiferentes. Questionamos, vivemos, vivemos, por dentro. Acreditamos, queremos acreditar, queremos acreditar que um dia acreditaremos. Apercebemo-nos que nem todos acreditam. Enrugamos papéis até ao lixo. Absorvemos. Voltamos. E, após jazer em nós próprios, depois de aproveitar a bruma difusa da noite, erguemo-nos...

Repetimo-nos. Só nos repetimos quando nos escondemos. E escondemo-nos sempre. Acima de tudo, ébrios ou despertos, desejamos. Acima de tudo, encontrados ou inventados, continuamos. Acima de tudo, queremos concluir algo que não se conclui: a nossa persistência de existir. Aproveitamo-nos dela.

E, hoje aqui, não queremos realmente que tudo isso acabe.

2004/05/11

Evidências

A chuva bate na janela,
como se fosse água trazida do céu.
As folhas balanceiam nas árvores,
como se fossem movidas pelo vento.
Os automóveis apressam-se,
como se houvesse um destino concreto
para quem os conduz.
O rio corre num leito certo,
como se um dia fosse desaguar no mar.

Tudo isto tão irritantemente certo,
tão fatalmente conhecido,
tão profundamente real
que anseio que seja falso...
...falso como as palavras que
exprimem o sentir.
...falso como as palavras que
contam a verdade.

2004/05/10

Fito.
O mundo do olhar em meu redor.
Cortinas de veludo preto
sobre os teus ombros descaídos.
Esfera corada de azul,
envolta em tule branco,
que salta nisso, que não és tu!


Ninguém é, porque todos querem ser.
Reveste-te de sentimento nú!
Rebola na areia e
espera que ela o acolhar nela!
Imprime tudo isso, que com fervor, desejas
em rocha solta, não perene.



Vai! Eu fico aqui, como o sonho.
Que o sonho sabe a tudo nos meus dias.
E a imaginação... Ah! Essa...
Essa dorme ao meu lado
Em todos os dias que se escondem na noite.

2004/05/07

Disseram-te um dia para teres cuidado com a paixão, a mulher por quem poderias apaixonar-te poderia trazer muitos transtornos para a tua vida, para o sucesso inesperado dos teus dias brandos e das tuas noites ofegantes. Depois apaixonaste-te. Depois amaste. Depois foste obrigado a fugir disso. Perdido entre os ideiais e a perfeição do classicismo grego e entre a fusão de todas as sensações o tumulto de sentir tudo sem qualquer regra feérica, mergulhaste a tua pena no tinteiro e deixaste-a voar.
Por Lia Goa:

"Tenho aqui, ao meu lado, bem visível aos meus olhos uma caixinha. Lá, embora pequenina, cabe toda a minha alegria, os meus sonhos, as minhas memórias do bem e do mal. Tenho aqui, na minha mão, parece estar viva esta minha caixinha, à qual chamo CORAÇÃO."

2004/04/16

Então vamos lá! Vamos escrever as nossas memórias. Só para nós. Chiuuuu! Ninguém pode ouvir, temos que falar baixinho... Vamos para ali, para aquele cantinho, traz a lanterna... cuidadoooo! Ninguém pode ver, temos que estar alerta... Agora pega na caneta (não te esqueças que o mundo que inventamos para ser nosso cabe aí dentro) e deixa que a sua tinta se espalhe como os teus dedos quiserem. Não te esqueças, a seguir sou eu!! Chiuuuu!

2004/04/15

Hoje resolvi ser eu,
resolvi portanto nada ser.
Se nada fui hoje,
nada era ontem
e se o nada é vazio,
é ausência de tudo...
então tudo até agora foi nada.
Todavia se eu não fui possível até hoje,
aqui nesta realidade,
então fui-o em alguma,
caso contrário,
estaria apenas hoje a inventar-me?

Entorpecida... é assim que me invento.
Mergulhada no mar dos adjectivos,
a poder pensar que os posso escolher.
A ter de me ter, para me saber existindo.
E a rir, desmedida de consciência.

Para finalizar, solto a final gargalhada indiferente.
Encosto-me a uma parede.
Não é do mundo que me rio, é de mim.
Fito a rua passante,
e espero que ela venha ter comigo.

2004/04/04

oNtEm


Quis que os abismos da loucura se fundissem,
que a penumbra dos olhares tristes se dissipasse,
que o frio em peles arrepiadas esmoreçesse,
quis ver o nevoeiro dos sepulcros emergir.

Quis ver nítida, ao fundo,
uma espiral convergir para um só ponto,
esse lugar que me faria lembrar
que tudo se pode tocar:
Serenidade e Adversidade,
Tumultos e Silêncios,
Tu Eu e Mundo.
hOjE


Cheguei e sentei-me,
num cantinho escondido.
Não é de alguém que
me escondo.
É de mim, do
modo como me sinto.
Inebriada, cruzos os dedos
e tenho fé de não me
voltar a encontrar.
Nem a mim, nem a
este coração solto
que vagueia em mim.
Porque é ele, que na noite,
vem ter comigo e
diz baixinho tudo
aquilo que nunca
quis escutar...
que repete sem cessar
a ilusão, o sonho
tudo aquilo em já tropecei.

2004/03/29

Euforia dos dias que chegam, sem que lhes peça coisa alguma... que chegam porque nascem assim, e porque morrem para que outro dia nasça. Quando recordo, esta sobreposição de momentos, em dias em que não me apeteceu ser, em que não me apeteceu conhecer, em que não me apeteceu pensar no que haveria de chegar, sinto-me resumida. Os dias que chegam, os dias que hão-de vir... esses engrandecem-me, fazem-me sentir maior.

Uma semana, um amontoado de horas inesgotáveis, cansadas, que me trouxeram até aqui. O início de outro amontoado de horas, em que posso fazer com que o mundo mude, em que posso não fazer nada. Em que posso morrer. É a ideia dessas horas, em que sei que posso receber o teu abraço, em que posso chorar junto a ti... ou em que me posso rir contigo, em que posso sorrir a outra pessoa, em que me posso deslumbrar convosco, é a ideia de que posso existir, que se encontra comigo agora.

Neste momento em que soube que nunca perderei o suficiente para igualar o sabor de ter ganho todas as presenças que me rodeiam.

2004/03/22

Absorveste o meu olhar quando nos vimos, refugiados na distância daquela tarde.
Absorveste-o, pensaste que era teu. Eu pensei que to estava a dar. Mas só to emprestei.
Depois viemos embora, abandonamos aquele momento e chamamos-lhe ilusão.

2004/03/16

Apetece-me escrever um poema


Não, não é um poema que escrevo.
Sim, sim as minhas frases começam
muitas vezes com não.
Como se negar, negar-me,
fizesse sentido,
tanto sentido como
manter o silêncio
por detrás das palavras.

Por isso não escrevo um poema,
não escrevo coisa alguma,
escrevo a negação
de tudo aquilo que poderia escrever.

Talvez nem escreva...
murmuro assobios acobardados
de paixão, de pessoa fruste,
de olhares enternecidos
com o simples,
com a rua,
com os cheiros crús do mundo,
com as navegações intempestivas
que um sorriso pode ter,
com as flutuações de uma voz tremida,
de uma voz que quer chorar.

Vou espreitando, de esguelha,
o mundo,
vou acumulando as sensações,
que encontro ao subir as escadas,
a pegar numa criança ao colo.

Prossigo escutando,
aprendendo o que escuto.

Deixo-me deslumbrar.

Penso-me sólida e firme
ou a desfazer por dentro,
mas nunca me vou pensando bem.

Caminho sem tocar o chão,
rebolo montanhas abaixo e rio-me.
Nada. Deixo-me sentir vazia.
Preencho-me.
Divago, permito-me fazê-lo.
Sinto-o com permissão.

Aprovo-me.

E os dedos continuam a correr teclados,
a deslizar com tinta.

Preocupo-me.

Padeço, com lágrimas.
Preciso de encontrar-me com a manhã,
com a noite.
Preciso reecontrar-me
com a sensação de reecontar.

Finalmente, detenho-me.
Risco um toque da minha consciência,
guardo-o na memória,
sem que me aperceba.
Falo.

Escrevo. Amo-te.
Despeço-me.

Entrego-me a alguém,
mesmo que na ilusão,
pois nem sempre sei o que fazer comigo.

Cuido ter tanto, mas tanto!
Perco-o.

Detenho-me novamente.
Recolho-me.
Uso verbos sem cuidado,
nem carinho.

Alongo-me perdida, nos meus olhos pesados...
em minutos sentidos.

Não leio.
Abandono estas palavras.
Deixo-as para quem
tropeçar nelas,
as palavras que são calçada molhada,
que já foram chuva,
que já foram nuvem,
que já foram mar.

2004/03/15

Será suficiente? Não. Não quero que me chames "amor". Faz-me sentir demasiadamente bem. Prefiro que não mo digas. Beija-me, só. Mas não me chames... não o faças!

Quando o fizeste, subiu de mansinho em mim a vozinha tendencialmente nascida para te retribuir a designação. Não te pude chamar "amor", não pude... porque quando tu o fizeste foi como atirar uma palavra para a rua, quando lhe chovesse em cima deixavas de a ver. Mas se eu o dissesse escorreria do meu para o teu olhar e provalmente não ias perceber que nem as minhas lágrimas iriam lavar o significado dessa palavra. Prefiro levar apenas o teu beijo, mas a palavra amor não a quero levar comigo, não outra vez. Prefiro repousar no eco que ela ainda faz dentro de mim e que de dia para dia é cada vez mais baixo... que cada dia ouço com mais dificuldade. Que um dia esquecerei como disseste, desprovido de sentido, insípido.

Amigo, ao entardecer nos jardins, ao lado do lago e falar de fotografia. É assim que tenho de te guardar.

2004/02/26

Houve um dia em que adormeceste a pensar que eu estava ao teu lado. Que imprudência! Não o terias feito, talvez, se soubesses que eu adormecia todos os dias a pensar que estavas ao meu lado.

Escrevi estas palavras e olhei para elas sem as ler. Assim, sem a observação mais cuidada, elas pareceram-me afinadas e ajustadas, certas para caberem dentro da realidade. Contudo, não cabem dentro de mim, ou não podem caber. Só porque já não estás comigo, as palavras já não me servem. O ar já não me serve.

É tudo o que consigo escrever, o que dirias se soubesses destas palavras. Tens que ir para a cama cansada, cansada de mundo, cansada de corpo, cansada de perceber, cansada de ilusão, assim tão profundamente cansada que já não consigas pensar.

Se existir verdade, eu quero que a minha verdade seja o que dirias se soubesses destas palavras.

2004/02/19

Insónia


No silêncio escuro e frio, sentia um à frente do outro. Ambos gelados, os meus pés, fincavam-se, com cada vez mais força, ao solo aparentemente macio e morno. Estremeci, soprou uma brisa fresca, olhei para eles, um à frente do outro, presos no chão da noite. Não se moviam, não seria com certeza esse o seu objectivo, eles pediam um caminhar sereno até ao aconchego da cama, mas eu permanecia ali, imóvel.
Eu buscava sensações, tudo o que pretendia era buscar algo mais para sentir, abusar dos meus órgãos sensoriais, abusar do meu coração. Queria inundar o espírito, ocupá-lo com sensação para não mais pensar, para me abstrair de tudo o resto. No meu quarto adormecera a solidão. Enquanto ali no corredor, permaneciam ares quentes do burburinho diurno, mantinha-se ali um sopro de calor humano das pessoas que tinham por lá passado durante o dia. Havia uma ilusão de que não estava só. Procurei não pensar, mas acabou por acontecer porque os pés são fracos e levaram-me no seu cansaço para o quarto adormecido e para a cama repleta de um aconchego cínico. Foi quando me ouvi murmurar: "Sou igual a todas as pessoas, aprendi a conviver com o medo."
Pensei em ti


Não chega. Pois não.
Eu sei.
Já estive aí.
As minhas lágrimas
escorreram no segundo em que me vim embora.
Agora, aqui sentada
junto ao correr do rio,
rodeada pelo ar gelado do Inverno,
cerco-me com o meu jeito triste,
a angústia que me faz suspirar,
que me faz temer cada um dos teus gestos.
Porque tu não sabes.
E eu não sei.
Choramos, cada um afinado
em prantos diferentes,
que se completam.
Se quisesses eu podia sorrir-te.
Sorriamos os dois.
Os dois. Nós.
Mas nós já não existimos.
Existe uma sombra, uma sombra vaga,
que chega voraz e foge.
Sem destino.
Foge e não volta... para sempre.

O vento ingénuo persiste e eu com ele.
E tu?
Tu estás aí, imparável
por detrás de uma cortina
Transparente.
Quando te toquei pensei sentir-te,
mas senti-te pensando.
Acordei. Já tinhas partido.
Como te vou dizer que persisto?
Que estou aqui...
...se o frio, o Inverno,
as horas geladas,
nos ensurdeceram?
pReCiSo dE Ti

Estava escuro mas eu acreditava que podia ver. Na verdade, sentia algum aconchego, a temperatura morna deslizava no meu corpo fluido do qual não me lembro. Sentia-o apenas. Continuava a não ver nada mas nunca nada foi tão nítido. Ouvia, um som que não consigo esquecer. É como se estivesse mergulhada numa grande profundidade algures num oceano e estivesse atenta escutando correntes. Isto é a memória de uma sensação, não o sonhei, é a memória mais antiga que possuo.

Depois disto veio uma total inconsciência, devem ter-se passado anos até eu me recordar do quadro de lousa e do alfabeto ainda imitado e difuso, sem qualquer sentido. Agradava-me agradar.

E antes?... antes estava o não existir. Como pode alguém recordar-se de não existir? É nítido: é não ser, escuridão e abstracção total, o vácuo a pairar numa dimensão que não é conhecida, é desconhecido e eu lembro-me. E toda esta loucura escreve-se com medo que eu acredite nela... com medo que nunca ninguém a leia, nem mesmo eu. E esta noção é profundamente triste e causa em mim quase como que um conhecimento prévio da morte. É isto, que me faz querer escrever mais e mais, porque a morte é apenas aquilo que cala.

Sempre que todas estas imagens me surgem penso que a morte lhes é semelhante e que se as tenho é porque algo em mim me quer lembrar que um dia não vou poder falar, nem escrever, nem tocar. Então quero fazê-lo mais do que nunca. Escrever, premir tecla a tecla... e dar sentido a palavras embora o sentido não seja comum. O sentido é apenas meu. Sei que mais ninguém compreende tudo isto. Porque o dom da palavra não é meu. Nem as palavras são minhas. Apenas o sentido é realmente meu. Resta-me, pois continuar...É triste! No limite, tudo o que nos resta é continuar. Porque se não continuarmos acabamos. “Para a frente é que é o caminho.” “Anda para a frente que atrás vem gente.” São as pessoas que dizem. Às vezes tenho receio que estejamos todos a deixar qualquer coisa de lado, a esquecermo-nos dos desvios e não respeitar as curvas. Vinte e quatro linhas a divagar, ando em círculos para fugir do que perturba cá dentro.

Continuar em frente...

Estou aqui e parei. A angústia e o cansaço apoderaram-se de mim.

Agora já não sou sozinha, tenho a alma para desculpar as minhas tormentas! Como se alguém já não me quisesse e isso me fizesse bem... é como se só agora, eu percebesse o que realmente preciso. E eu preciso de ti.

2004/02/10

Aos que se dizem intelectuais

Alguma Metodologia de Análise de Genes e seus Produtos... O livro está à minha frente, já vou lê-lo.
Pus-me a falar comigo própria, discuti intensamente a economia mundial. Como se eu tivesse palavras com gabarito tal para discutir um tema profundamente complexo como este! Não faz mal... só eu é que ouvi. GGRRR!A raiva explode dentro de mim:pessoas atormentadas, vivem delírios realistas que só elas entendem. Comunicam-se na sua própria gíria libresca, erudita quiçá.... e ninguém os compreende, nem a sua profunda amargura, inatingível, em que mergulham fugindo de mundos que os trespassam como punhais. Quando soletramos algo na nossa linguagem primitiva soa-lhes ao longe um eco de sátira, que disfarçam cm frases de compreensão e murmúrios que afagam a nossa burrice. Ou será a deles?
Sim... somos ignorantes, gritamos para que ouçam bem. E pedimos imensa desculpa... hoje não, não vamos salvar o mundo, nem vamos traçar estratégias intelectualmente eficazes para o fazer. Hoje vamos ficar a ler sobre genética, mas não queremos cultivar-nos. Queremos olhar para o rio e senti-lo. E não vamos falar disso, porque não é preciso e porque há dias em que não precisamos de saber se Deus existe, há dias em que queremos prosseguir errantes, em que queremos usurpar a cidade e queremos ser fracos e fáceis.... porque ser um enigma nem sempre nos torna mais apetecíveis de decifrar. Não. Hoje não vos podemos ajudar a sentir bem, porque hoje nos sentimos mal. Com uma revolta profundamente infantil e triste.
Hoje acordamos depois de sonhar com a igualdade feérica. Hoje acordamos e desiludimo-nos... como vocês! Depreendemos, do ar frio da manhã, que há coisas que jamais se conseguem abrigar e as nossas feridas (como as vossas) provam-no. Não há feridas boas. Não existem. Hoje acordamos e despertamos para nós , valorizamo-nos e erguemo-nos da cama como quem ergue a voz, para entoar: "Hoje não me consegui ajudar, mas também não te vou ajudar a sentir inteligente!!!"
E pessoas estúpidas NÃO há, reticências... Há apenas pessoas que desistem, ponto final.
O Fim do Princípio

Hoje começou uma nova sensação, a sensação de mundo... infinita, interminável, olhar de esfinge posto em mim. Em nós.
Hoje inaugurando este blog... derramo alguma tristeza, e encerro alguns sorrisos que aguardavam por ele.
Hoje iniciando algo, não sei como começar, nem como terminar. Mas sinto-me bem, porque isto toda a gente que conheço sabe.

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