Alguém que me lê e eu não vejo.

2004/09/17

Corres, corres, corres, sempre a correr sempre a arfar
nunca esgotas esse olhar dilacerante sobre os caminhos.
Não interrogas permanentemente, vais, corres.
Foges de fugir desse mundo insípido, cheio de presilhas imprevistas....
que desabotoas com frequência.

Tem que ser, nesses infernos cheios de "ques".
Porque é essa a meta, de quem corre, de quem salta de quem foge de fugir.
Esgalhas por entre cêntimos e por entre filas de espera.
Tens meio século e não podes continuar a correr, mas tu foges de fugir...
O coração é fraco já, está cansado, mas aguenta, tens cataratas mas mantens o teu olhar.
O teu filho, quer correr e quer voar e não pode, tens que o desencarecerar, mais um fecho que tens de abrir, mais uma ruga que acrescentas à tua expressão fatigantemente pálida.

Não és mais que um número escrito algures, um conjunto de algarismos aleatórios
que jazem em prateleiras ou pedaços de sílicio...
não fazes diferença por lá.
Mas sem esmorecer recusas-te a parar, até ao dia em que descobres que há mais um "que":
O "Porque". E então resolves andar por aí a somar "porques"... até que no conjunto, todos formam um "porque" que ninguém poderá deixar de escutar: "porque não"!

2004/09/08

Chove na cidade onde penas de aves apressadas, em busca de abrigo, flutuam comandadas por um vento ameno. A chuva cai sem força mas cai convicta. Os autocarros deslizam nas ruas para que as pessoas possam chegar a algum lado. Um casal de gaivotas foge das turbulências do oceano, procurando o aconchego de um beiral. O vigor da água caída do céu escuro aumenta numa cadência típica dum crescendo musical...
Todo este cenário se reflecte em mim através de quatro pedaços de vidro que constroem uma janela. O edifício que me acolhe encerra décadas de lágrimas e sorrisos, de suspiros e de palpitações... de empenho árduo e suave boémia. Resguardo-me, aqui sentada, onde começou a Universidade do Porto, no edifício vulgarmente chamado “Leões”: uma alusão pertinente à fonte que banha a sua entrada principal. A fonte onde lamentações se afogaram e onde começaram algumas existências... águas onde couberam muitos mundos ansiosos de vida e conhecimento. Caminho pelos corredores imensos, que já deixaram de ser labirínticos, e estórias renascem com palavras repletas de esperança. Recantos sensuais onde começaram longas uniões. Bancos onde escorreram prantos de desânimo e que ouviram repetidos cânticos de orgulho. Estes locais que somados me têm ajudado a ser um pouco maior e que recordarei com as palavras, os aromas e a sensação de frio no Inverno. É reconfortante estar aqui, encostada a este granito secular, a esta janela enriquecida pelo mundo, pois cada murmúrio de existência neles gravado amplifica cada segundo dos meus horizontes tremidos.

2004/09/05

Alguma vez pensaste no porquê?

Dos sons fluirem afinados por noites distantes.... em que pequenas lágrimas parecem unir os nossos dedos outrora trespassados pela mesma brisa arrepiante junto ao mar.

Arquivo do blogue