Alguém que me lê e eu não vejo.

2005/01/24

Fotografia.

Olhei para nós. Havia passado mais de um ano desde que aquela imagem tinha sido, por nós, raptada do tempo equilátero.
Os teus olhos falavam, diziam que queriam escapar por entre o magnetismo daquela noite directamente para a seguinte noite... num passo mágico de adormecer e acordar. Diziam-me que estavas ali e que talvez um futuro inebriado trouxesse de novo aos teus olhos a vontade de falar daquele modo, para mim. Os teus olhos falaram para o futuro, falaram para que, inadvertidamente hoje, pudesse fitá-los, na ausência da tua presença, e me lembrasse que naquele segundo, todos os teus sentidos foram meus. Gritavam: Conseguirás sempre despir a felicidade como despiste hoje os teus receios ingénuos de viver.
Os meus olhos não diziam nada, encostavam-se a um infinito distante, de mágoas adivinhadas. O sorriso do meu rosto vivia o momento, os meus olhos avistavam as paisagens desérticas, ao entardecer, nas arestas geladas da minha almofada triste, nas minhas mãos que sentiriam a falta do teu toque... todo aquele que tinha absorvido antes.
A tua mão na minha cintura, a eterna inocência dos meus olhos fechados para prolongar, no percorrer do sempre, o som ondulante de um “clic”.

2005/01/16

Estou tão sozinha, por vezes... até sinto um arrepio gelado, uma brisa que chega em forma de lágrima e pergunta: como é possível?

É possível sim. Quando passeamos à noite e a olhar as estrelas as vejo sorrir de tão longe! É possível quando molho os lábios com a água salgada das tuas frases impensadas... da insignificância. É tão possível como alguém ter razão nos deixar sozinhos..É possível como doer tanto quando alguém faz por ter razão. Tanto que penso sempre estar sozinha. Nos meus pequenos interesses... estou sozinha quando leio o poema que fala do equilíbrio de Hardy-Wienberg, estou sozinha ao ouvir vezes sem conta Nessun Dorma... ou a Mercedes... a Mercedes... com o coração olhando para o sul, para a dor do seu povo, para as tardes soalheiras e as casa brancas e a paz do sorriso de muitas crianças, a paz do sorriso das pessoas sem pressa da vida. Bem me disse ela, vezes sem conta, que tudo muda, que o tempo é resoluto, que se encarrega de levar tudo. Mas ela também me disse que basta entregarmos os nossos corações para que o nosso mundo não esteja perdido.

E dói pensar que tudo isto é insignificante se não estiver sozinha. Que o que eu sou cá dentro, sou-o sozinha. Que as minhas palavras emudecem os que me rodeiam, ou que chamam apenas alguns risos de troça.

Nem sempre é assim... nem sempre ajo pensando que estou perto, às vezes estou realmente perto.